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Clássicos com torcida única, problemas no calendário, poucos torcedores nas arquibancadas, clubes endividados e um presidente de uma confederação que não pode sair do país sob a ameaça de ser preso. Esse é o atual cenário do futebol brasileiro, que ainda assim, segue como responsável por um dos campeonatos mais instigantes, interessantes e equilibrados do mundo, o Brasileirão.
Oficializado em 1959, o Campeonato Brasileiro era chamado de Taça Brasil e apresentava um modelo de disputa nos moldes do famoso “mata-mata”: os campeões dos torneios estaduais se enfrentavam em chaves eliminatórias até se consagrar um campeão. Foi só a partir de 2003 que o torneio adquiriu o modelo de pontos corridos, formato que exige maior regularidade e planejamento das equipes por se tratar de um campeonato medido a longo prazo, e a partir de 2006 disputado por 20 clubes.
Ao longo de sua história, este esporte consagrou-se sempre por sua alegria, técnica e talento apresentados em campo, mas acima disso pelos espetáculos nas arquibancadas, com torcidas em grande número, bandeiras e intensas rivalidades entre os principais clubes de cada estado.
Hoje, em 2017, tal conjunto de características responsável por tornar o país uma referência no futebol mundial parece estar se perdendo. São inúmeros os problemas, desde a crescente violência fora dos estádios e o despreparo das instituições para lidar com tal questão, a má organização do calendário anual, até as vergonhosas situações que envolvem a principal entidade do esporte nacional, a CBF.
Estes e outros problemas geram uma verdadeira crise, institucional, financeira, técnica e por aí vai. Contudo, ainda é possível afirmar que o torneio nacional se mantém como referência mundial no que diz a disputa, novos talentos e, mesmo que abaixo do que já foi, de bom nível futebolístico competitivo. Sem dúvida, uma das melhores ligas mundial.
Em 2017, o Campeonato Brasileiro terá entre os 20 clubes, pelo menos nove grandes e 15 já campeões nacionais, dentre os quais quatro merecem destaque – Santos, Palmeiras, Atlético MG e Flamengo - muito por seus elencos, mas também pela continuidade do trabalho, que nesse começo de ano já mostra sua importância.
Assim, ainda que deficiente tecnicamente, o campeonato mantém uma constante característica: o grande equilíbrio - desde 2003 foram sete times diferentes que ganharam a competição, um a mais que o francês, campeonato europeu, dentre as cinco ligas de grande nível, com mais vencedores nesse mesmo período.
Nessa mesma linha, quando comparada às cinco principais ligas europeias, fica evidente a parelha disputa pelas posições no Brasileiro. A melhor campanha, no modelo atual, foi a do Corinthians em 2015, somando 81 pontos em 38 jogos, 21 pontos a menos que a italiana Juventus na temporada 2013/2014, que coroou o título com 102 pontos somados nos mesmos 38 jogos. Outros dados interessantes remetem a maior distância de pontos entre primeiro e quarto colocados. Em 2015, a diferença foi de 19 pontos no Brasileiro, 23 a menos que no Campeonato Espanhol 2011/2012, no qual, o Real Madrid foi campeão com 42 pontos de diferença para o quarto colocado. Mais absurda ainda foi a temporada 2015/2016 do Campeonato Francês, que teve o PSG como campeão, há oito rodadas do fim, com 31 pontos de diferença do segundo colocado.
Se então, comparadas as campanhas com o melhor saldo de gols do Brasileiro - Cruzeiro em 2003 com 55 gols de saldo em 46 jogos - com o melhor saldo do Campeonato Alemão - Bayern de Munique com 80 gols em 38 jogos na temporada 2012/2013 – fica ainda mais nítida a diferença na competitividade dos campeonatos devido ao domínio de um ou dois clubes nos torneios europeus, principalmente nas ligas citadas acima, que parecem ter ano após ano campeonatos que são cópias de seus anteriores, além de duelos repetitivos que canalizam grandes emoções para as mesmas torcidas, cidades e estádios.
Dessa forma, no que diz respeito a paridade, o único campeonato europeu que bate de frente com o nosso é o Inglês. Muito disso em função dos novos acordos de direito de imagem, no qual os times menores têm a possibilidade de se equipararem financeiramente aos grandes milionários - visto o Leicester, campeão na temporada 2015/2016. Mas além do equilíbrio financeiro, o inglês tem vários grandes clubes, o que traz, assim como no Campeonato Brasileiro, a frequente dúvida sobre quem será o campeão.
Porém, além do equilíbrio, a liga brasileira chama atenção também por dois fatores: o crescente número de jogadores já consagrados ou na fase final da carreira, que voltam ao Brasil, e o notável número de atletas da base que tem sua chance de expor seu talento no cenário nacional. Nessa edição, nomes como Felipe Melo, Grafite, Diego, Montillo e Thiago Neves são destaques entre os medalhões e chegam não só para somar experiência a seus grupos, como para elevar o nível técnico e tático dos clubes.
Mais recentemente Gabriel Jesus, através do Campeonato Brasileiro, alavancou sua carreira para nível internacional e logo foi contratado por um grande clube europeu, assim como pode ser para Vitinho, Maycon, Léo Jabá, Luiz Araújo, Vizeu, Júnior Tavares, Vinícius Júnior e tantos outros jovens talentos recorrentes por aqui.
Por último, este esporte brasileiro é tão clássico e tradicional quanto importante para seus adeptos e torcedores. O curto período sem jogos na virada do ano deixa essa questão explícita aos que acompanham rigorosamente seus times. As torcidas, salvo exceções, não lotam os estádios como antigamente, muito por conta dos altos preços dos ingressos, assim como em muitos jogos europeus, mas, em compensação fazem com um terço da capacidade do estádio muito mais festa, e incentivos ao seus times. A maioria dos grandes públicos são nos clássicos, mesmo que em alguns estados com torcida única. Em 2017 serão quatro – MG, PR, SC, BA – com dois rivais cada, além do RJ e SP com quatro rivais, na Série A, o que reforça o equilíbrio do campeonato com “campeonatos a parte”.
Assim, a lembrança do torcedor, para aquele mais velho ou então o imaginário daquele que apenas ouviu falar, traz aos dias de hoje a noção de que um dia nesse campeonato já jogaram por muitos anos, Zico, Pelé, Garrincha, Ademir da Guia, Romário, e defenderam seus times com admirável classe, técnica e talento e não a toa ajudaram com que o torneio fosse um dos melhores do mundo. Claramente, passamos por um momento de crises estruturais e de má administração, principalmente por parte da CBF. O calendário dá cada vez mais sinais de que não é o ideal, os clubes têm cada vez mais complicações para se planejarem e desenvolverem seus objetivos e isso tem como reflexo dentro de campo a carência técnica. Contudo, mesmo com a decadência da liga, em meio à bagunça das instituições que o regem, o campeonato consegue se manter como um dos melhores para se assistir e acompanhar. Ainda é imprevisível nas disputas, surpreendente nas cíclicas revelações e medalhões, extensa na história dos confrontos e muito envolvida socialmente, e assim se mantém como referência mundial.
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