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Ciclismo: As “sufragistas” da bike

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Crédito foto: Getty Images

Ciclistas pioneiras na história contemporânea

De sua pequenina cidade até Milão ela perfazia 40 quilômetros de bicicleta, todo santo dia, para ir trabalhar durante os seis longos anos da II Guerra Mundial. O relato é da minha avó italiana, a nonna Bruna, hoje com 91 anos. Mesmo com a limitação do defeito de nascença nas pernas, nunca deixou de fazer o que bem entendia. Debaixo de neve, bombas e ataques nazistas, pedalava e cantava antes do sol raiar. Mulher de fibra ignorava a maledicência dos vizinhos contra quem ousasse sair do lugar-comum.

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Soldado russo brigando com mulher alemã em Berlim por uma bicicleta, 1945. Crédito foto: Getty Images

Se nos anos de 1939 a 1945 o preconceito em relação às mulheres era tamanho, imaginemos retroceder no tempo. “A mulher está pedalando em direção ao sufrágio”, anteviu a americana Elizabeth Staton (1815-1902), em meio a um dolorido e florescente final de século XIX travado entre lutas feministas pelo direito ao voto, igualdade e liberdade de ir e vir.

O gosto estético da moda vitoriana tirava o fôlego. Opressão e rigor moral desfilavam pelos salões nos panos e laços dos espartilhos. Fazer ginástica ou pedalar era antônimo de “bela, recatada e do lar”. Com o diafragma e a mente reprimidos, as belezuras permaneciam aprisionadas sob as infinitas camadas dos vestidos.

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Catálogo nº 52 com os tipos de espartilho da B. Altman & Co. – Spring and Summer, 1886. Archive.org

 O trabalho feminino nos campos e nas fábricas crescia exponencialmente na década de 1850. Incomodada com a situação, Amelia Jenks Bloomer, uma nova-iorquina defensora dos direitos feministas e vegetariana, inspirou um modelito de vestuário feminino revolucionário: “as bloomers”. A antepassada das calças era uma espécie de saia bifurcada larga que permitia maior movimento. Amelia Bloomer sim é que era mulher de verdade!

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A bicicleta – A grandiosa reforma na moda, século XIX. Genealogylady.net

Francesas e americanas foram grandes pioneiras no pedal. Mas as barreiras enfrentadas por elas foram gigantescas. Na medicina, por exemplo, o doutor Phillipe Tissié (1852-1935) teorizava o perigo da esterilidade e aborto para a mulher que usasse uma bicicleta. Para não dizer do tabu moral vetando um suposto e impudico prazer no atrito do selim com partes íntimas. Tenha dó...

Uma luz no fim do túnel chega com outro médico, também francês, Ludovic O’Followell. Para ele, ao contrário do que se dizia, o ciclismo melhorava a saúde da mulher sem riscos às gestantes. Força, agilidade e velocidade ainda persistiam (e persistem?) como prerrogativas exclusivamente masculinas. O temor da perda da sensibilidade, delicadeza e da elegância do “sexo frágil” era (ou ainda é?) fremente.

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Três mulheres à frente do seu tempo e dois homens talvez conformados. Crédito foto: Divulgação | Vadebike.org

 

 

Proibições e censuras esmigalhavam qualquer vontade das mulheres perambularem com suas “magrelas” por aí. Competir? Utopia! No Brasil, em 1887 registra-se uma rara participação de moças nas provas de duplas mistas no Frontão Velocipédico Fluminense, no centro do Rio de Janeiro, e olhe lá. As corredoras suscitavam estranheza e escárnio, contrapostas à imagem das expectadoras exaltadas pela beleza nos velódromos durante as provas especiais de turfe ou remo.

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Anúncio da Casa Três Leões. Venda de bikes para mulheres, 1945.  Crédito foto: Divulgação | propagandashistoricas.com.br

Três histórias. Uma italiana incrível tête-à-tête com os gigantes do Giro d’Italia - Alfondina Strada. Uma imigrante letã de família judaica dando a volta ao mundo numa bike - Annie Londonderry. Uma costureira afro-americana embrenhada na Liga de Ciclistas Americanos - Kittie Knox. Relembrar nossas precursoras. Propagar suas conquistas maravilhosas. Continuar e ampliar seus legados.

E agora, Josefa? O vento no rosto, o ritmo individual, as ladeiras chamando para a briga. Apesar da descrença no potencial das dondocas, elas avançaram impávidas e descortinaram nobres horizontes. Hoje, a bicicleta é uma “alternativa” à prevalência dos motores. A mobilidade urbana paulistana discutida, polemizada com ou sem as ciclofaixas. As bretelle e acessórios femininos sem tanta variedade, cores e versões. O incentivo inferior ao masculino e a exposição midiática praticamente nula das versões femininas do Tour de France (La Course) e do Giro d’Italia (o Giro Rosa).

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Sprint da ciclista britânica Elizabeth Armitstead (à esquerda). Mundial UCI de Ciclismo de Estrada 2015.

Apesar dessas e outras dificuldades, o ciclismo ainda é e sempre será uma experiência individual, porém coletiva, simples e democrática, esportiva e deliciosa a ponto de nos permitir respirar, apreciar paisagens, conhecer lugares e pessoas, exercitar as canelas e sentidos na cadência do giro das engrenagens. Alcançando velocidades e “lonjuras” nunca dantes pedaladas, ciclistas mulheres, homens ou crianças, de todas as raças, cores, idades ou credos devem ter seus direitos respeitados e a equidade garantida. Mães, esposas, irmãs, avós. Somos todas Alfonsinas, Annies e Kitties.

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Categorias: Esporte, história, Ciclismo, bike, ciclistas, bicicleta, ciclista, pioneiras, ciclismo feminino, emancipação feminina, mulher, feminismo, pedal

Nina Ratti

Escrito por Nina Ratti

Nina é de Sampa com italianíces. Adora ciclismo e ama o "Giro". Estudante casperiana de jornalismo curte as editorias Internacional e Economia. Mexe com papel, impressão e arte visual na Ufficio Copia. Participa da Oficina na Rádio Conectados FUNSAI. Graduada em Psicologia pela USM e em Língua e Cultura Italiana pelo ICoN - Pisa, Itália. Mais analógica, menos digital. Se embrenhou na restauração de livros, desenho técnico e fotografia. Pedala, coleciona selos e toca Raul nos seus raros instantes de ócio.

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